"Estou confiante desde o início. Portugal pode conseguir um triunfo importante para a qualificação". Assim começava o rol de profecias disparadas por Jorge Jesus ao mesmo ritmo alucinante com que se cumpriam.
O homem que devolveu o Benfica às grandes conquistas voltou ontem ao microfone da Rádio Renascença e não fez por menos, entregando-se a um verdadeiro espetáculo na arte vanguardista em que se tornou o comentário de bancada.
Premonição
A velocidade com que engatilhava premonições certeiras levava o auditório ao rubro. E quando voltava à antena para nova sessão de "tal como eu tinha dito há pouco...", as palmas abafavam o estridente ecoar das vuvuzelas.
Aos 15 minutos, a Jabulani, teimosa, nada queria com as redes de Ri Myong Guk, mas Jesus "já esperava um rival difícil". Depois chegou o golo de Raul Meireles e já só faltava "Tiago acompanhar os bons movimentos" e "Simão e Ronaldo aproveitarem o espaço interior para Portugal voltar a marcar". Isto porque "a Coreia não tem cultura defensiva".
Dito e feito. Aos 64' já os Navegadores haviam dobrado as tormentas: "Já tinha previsto que o jogo estava a ficar fácil. Agora, é importante que o Carlos mexa na equipa, porque ainda vamos a tempo de sermos primeiros no grupo". E o professor mexeu... fazendo descansar Tiago, Simão e Hugo Almeida.
Depósito do técnico não leva polémica
Mais do que pela ausência de golos e do consequente triunfo, a estreia de Portugal no Mundial ficou marcada pela prestação de Deco, dentro e fora do relvado. Críticas a Carlos Queiroz à parte, a performance do médio do Chelsea levou Jorge Jesus a considerar que Deco, "a gasóleo e com esta velocidade, não precisa de ser marcado".
Ontem, o treinador, de 55 anos, chutou a polémica para canto, fazendo questão de explicar o porquê de tão curiosa expressão. "Eu disse que o Deco anda a gasóleo porque ele acabou a época mal fisicamente. Digo isso aos meus jogadores muitas vezes e eles entendem o significado. Quer dizer que não estão com a intensidade exigida", esclareceu Jesus, antes de afiançar nova premonição: "Se o Tiago se mantiver a este nível, continuará a titular porque o Deco não tem este andamento."
Um Meireles bestial
Nunca a expressão de "bestial a besta" fez tanto sentido como ontem. Mesmo que invertida... A prestação de jogadores como Miguel, Simão ou Raul Meireles ameaçava colocar os nervos dos adeptos em franja, a cada passe errado ou a cada má receção. Mas eis que, num repente, o médio pontapeia a monotonia com o golo inaugural, exorcizando a ansiedade que se alastrava a todo o auditório.
O portista partiu depois para uma prestação de sonho, assistindo... Simão para o segundo. Sempre sob o olho de lince de Jorge Jesus, que muito antes havia falado de um Meireles "que sabe jogar neste 4x3x3 e ocupar os espaços como deve ser". Porque a crítica é implacável, o treinador do Benfica deu, consumada a cabazada com que Portugal aviou os norte-coreanos, o exemplo, deixando um alerta a todos aqueles que deixam de fora a razão, na hora de torcer apenas com o coração: "O homem do jogo foi o Raul Meireles. Temos de ir com calma. Chegou-se a um ponto em que até o valor do Ronaldo estávamos a colocar em causa só porque não marcava golos."
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